Sexualidade

Eles sabem tudo. Será?

Nunca os adolescentes foram tão bem
informados sobre sexo. Mas nem sempre
eles levam a teoria à prática

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Há uma notícia ótima no campo do comportamento: pesquisas mostram que, quando os jovens de hoje vão fazer a iniciação sexual, já conhecem bem a teoria. A geração atual – principalmente os adolescentes das classes A e B – é provavelmente a mais bem informada sobre sexo em todos os tempos. Ela lê a respeito do assunto em revistas, suplementos de jornais e livros educacionais. Assiste a programas de TV que tiram dúvidas sobre sexo. Tem à disposição vários sites da internet que respondem a perguntas relativas ao tema. Por fim, a educação sexual já é obrigatória na maioria das escolas particulares e começa a se espalhar também pelo ensino público. Infelizmente, há uma notícia ruim, que é dada pelo psiquiatra paulista Jairo Bouer, referência da juventude quando o assunto é sexo.


"Eles não conseguem processar toda essa massa de informações e, na hora H, fazem quase tantas burradas quanto a geração anterior." Ele quer dizer que tanta teoria não se traduz necessariamente numa prática mais cuidadosa. O índice de gravidez na adolescência ainda cresce no país. E o uso de camisinha é abaixo do esperado, apesar de todas as campanhas de instituições públicas e privadas.

Quais as razões dessa distância entre a teoria e a prática? A primeira delas é óbvia: sexo não é só uma questão de informação, mas também de maturidade. É fundamental o adolescente conversar de maneira franca com quem está próximo a ele e pode passar a própria experiência sobre o assunto – ou seja, os pais. "Por incrível que pareça, a maioria das famílias se esquiva de falar de sexo com o jovem porque acha que pode deixar tudo nas mãos da escola", opina a psicóloga Helena Lima, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. A questão, no entanto, é complicada. A maioria dos adolescentes não quer escutar sermão dos pais sobre o assunto. E, mesmo que a conversa não seja em tom de bronca, não se terá jamais a garantia de que o diálogo surtirá o efeito desejado. Uma garota que tem um relacionamento franco com os pais pode, numa relação sexual com o namorado, sentir vergonha de tirar a camisinha da bolsa.

Outra questão é como falar a linguagem do jovem. O grosso das campanhas e dos programas de ensino, segundo os especialistas, fracassa justamente nesse ponto. "A maior parte das escolas recorre a palestras, e elas são chatas", avalia a médica Albertina Duarte Takiuti, do Hospital das Clínicas de São Paulo. "Se forem inevitáveis, que sejam curtas e dinâmicas." Idéias não faltam. Que sejam postas em prática. É uma vergonha o adolescente brasileiro ser reprovado numa matéria que conhece tão bem. Em teoria, pelo menos.


Os códigos do ficar

Dos primeiros beijos ao sexo, muita coisa está
mudando
– em ritmo acelerado – no modo como
meninos e meninas se relacionam

Quando a festa do colégio começou, às 20 horas, Gabriela Cunha já estava na frente do palco em Canoas, no Rio Grande do Sul, rodeada pelas amigas. Naquela noite, o plano das meninas era um só: ficar com alguém. Nos dias que antecederam a noitada, Juliana Moraes contava os minutos. Com a ajuda de Gabriela, havia combinado de ficar com um menino chamado Pedro. "Minha amiga é tímida, então fui até o guri no intervalo e perguntei se ele queria ficar com ela na festa. Ele topou", diz a desinibidíssima Gabriela. Conforme a noite avançava, os casaizinhos começaram a "grudar" pelos cantos. Grudar é a gíria corrente no Sul para falar de beijos e amassos. Algumas meninas da turma de Gabriela encontraram seus "ficantes". Pedro desistiu do combinado com Juliana em cima da hora – e beijou outras três meninas. Pouco depois, dois meninos se aproximaram de Gabriela. "Tu não queres ficar com meu amigo?", um deles perguntou. Gabriela disse não. "Não deu vontade. Ele não tinha nada a ver comigo." Às 11h30, a festa acabou para Gabriela. Sua mãe havia combinado de buscá-la a essa hora. Mas a noite de azaração não foi uma decepção total. Gabriela, que antes daquele dia já havia ficado com quatro meninos, não acrescentou um quinto à sua lista, porém descobriu uma nova comunidade de encontros on-line. "A internet é ótima para planejar uma ficada", diz ela. Gabriela e suas amigas têm entre 11 e 12 anos.

Gabriela, 11 anos: ela já ficou com quatro, mas preferiria namorar
Não faz muito tempo, uma cena como essa seria difícil de imaginar. Não apenas pela precocidade, mas também porque os códigos do relacionamento entre meninos e meninas eram bem diferentes. Mesmo entre os mais arrojados, o beijo era o ponto culminante de um encontro que costumava envolver muita conversa, uma ida ao cinema ou a uma lanchonete, a dança das músicas lentas na domingueira. Havia um ritual de cortejo que hoje em dia foi descartado. Na era do ficar, não se perde tempo com pudor ou amenidades quando existe interesse físico. Às vezes, tudo pode ser tão rápido que se torna difícil entender como acontece: um esbarrão, um braço puxado, um "grude" e pronto. Algumas boates dão uma mãozinha aos freqüentadores inventando sinalizadores, como pulseirinhas fosforescentes de várias cores, para indicar quem está disponível e quem está fora do mercado. Depois da ficada, nada mais é certo. Às vezes, a história não se esgota numa única noite e se repete de tempos em tempos, transformando-se num "rolo". Aí entram em jogo outras regras de etiqueta, quase todas negativas: não ligue para jogar conversa fora, mas apenas para planejar o próximo encontro (aliás, prefira as mensagens na internet); não exija atenção no dia seguinte; não tire satisfações se a pessoa sumir. Enfim, mantenha tudo simples e descompromissado – esta última, aliás, é a palavra que define a essência desse tipo de relacionamento. "Na única vez em que tentei namorar, a menina queria saber o tempo todo o que eu estava fazendo. Não quero nem pensar em fazer isso de novo", diz o paulistano Rogério Lacorte, que, aos 15 anos, é um adepto incondicional das ficadas.

Rogério, 15 anos, só quer ficar. Aline e Rafael, 17, namoram. Nas boates, pulseira verde para quem quer ficar e vermelha para os que já têm par
eider
Alexandre Schneider
O desembaraço com que os jovens aprenderam a embarcar em suas aventuras eróticas pode dar a impressão de que o ficar é uma prática livre de ansiedades. Mas essa impressão não corresponde à realidade. Apesar de opiniões como a de Rogério, o fato é que as opções da ficada e do namoro vivem em tensão constante na cabeça de muitos adolescentes. "Sempre quis namorar, mas os guris não topam", diz Gabriela Cunha. A diferença de expectativas sobre o relacionamento, sobretudo entre aqueles que têm algum vínculo no cotidiano, como a escola, também pode provocar confusão e sentimentos de rejeição. "Porque ganharam a liberdade de experimentar mais, meninas e meninos às vezes se vêem obrigados a fazê-lo. Isso pode ter um custo sentimental grande", explica a antropóloga Miriam Goldemberg. Rafael Coelho e Aline Lessa, ambos de 17 anos e moradores de Salvador, descobriram quanto o ficar pode ser estressante e resolveram testar o namoro depois de um mês do primeiro beijo. Eles formam o único casal estável de sua turma, mas hoje não se incomodam. "Namorar é mais sossegado", diz Rafael.



Multidão de jovens se beijando: o beijo deixou de ser o ponto culminante de um longo ritual

A equação do ficar se torna mais complicada – e arriscada – quando o sexo passa a fazer parte dela. Ao contrário do que se imagina, o sexo não é um elemento essencial do ficar. Aliás, nem mesmo as carícias pesadas o são: numa enquete realizada há pouco pela revista adolescente Capricho, 66,7% das meninas entrevistadas disseram que não fazem carinhos mais ousados no parceiro mesmo quando têm vontade. É verdade, contudo, que a iniciação dos adolescentes no sexo está ocorrendo cada vez mais cedo, e, quando a lógica descompromissada das ficadas se aplica à cama, aumenta muito o perigo de haver sofrimento, assim como o risco de contaminação por doenças sexualmente transmissíveis ou de gravidez indesejada. É com base nesse temor (fundamentado) que os pais torcem o nariz para a idéia do ficar. Como os especialistas não se cansam de lembrar, a melhor solução para aplacar esses temores e tornar mais seguro o caminho dos adolescentes na hora da iniciação sexual é a conversa aberta e sem sermões. "Ao ficarem, os jovens estão buscando um jeito próprio e mais livre de se relacionar, e não é preciso ver esse fenômeno apenas sob um prisma negativo. Mas os adultos não devem abrir mão de dialogar com eles", diz a socióloga Miriam Abramovay, coordenadora da Unesco.





Assim pega mal


Eles puxam o braço delas. Formam uma rodinha e exigem beijos. Ou ainda, para usar a gíria corrente, "grudam" a garota na parede. Cada vez mais os meninos estão usando a força – e nem um pouco de sutileza – para abordar as meninas na noite. Quem adota esse comportamento geralmente adora exibir sob a camiseta justa os músculos que cultivou em horas e mais horas de academia. "Diria que eles sofrem de complexo de Adônis", diz a antropóloga Miriam Goldemberg, referindo-se à compulsão de cultivar um corpo perfeito como o do personagem da mitologia grega que representava o máximo da beleza masculina. "Mas eles acrescentaram um elemento de violência a esse quadro. Acreditam que ter um corpo forte e ser agressivo é sinônimo de masculinidade." No extremo do comportamento violento estão os "pitboys" cariocas. O rótulo que os descreve é uma mistura de playboy e pit bull – a raça ultra-agressiva de cães de rinha. Os pitboys são garotos musculosos de classe média alta que, depois de algumas doses de bebida alcoólica, pegam pesado para o lado das meninas – e de quem mais estiver em volta. Não raro, quando abordados pelos seguranças das boates, quebram tudo. Nos primeiros quatro meses de 2004, os incidentes envolvendo pitboys foram freqüentes e acabaram até nas páginas policiais. Meninos e meninas "normais" estão assustados com a agressividade gratuita que os pitboys demonstram, e não sabem como reagir. Para eles, a única dica é: cuidado, pois eles costumam atacar perto da porta do banheiro feminino.




Namoro e Sexualidade


Entrevista


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